001 — Perdido na cidade grande

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A cidade de Lilycove não era tão diferente assim de Rustboro.

Ainda que estivesse longe de tudo e de todos que conhecia, existia um fator que poderia fazer o monotreinador se sentir em "casa": O fato de que ambas as cidades eram grandes metrópoles do continente, ainda que voltadas para diferentes aspectos - Rustboro possuía uma pesada zona industrial, enquanto Lilycove se voltava essencialmente ao comércio, fato que era visto com facilidade com uma mera análise de praticamente qualquer quarteirão. O rapaz já estava meio perdido no local, com tantas dúvidas e incertezas rondando a mente, mas com toda a certeza seu estado seria ainda pior caso tivesse uma origem rural, considerando o tamanho da ex-capital.

A viagem até ali tinha sido a parte mais fácil - entretanto, o problema era que ela acabava por aí. A partir de agora, o moreno seria obrigado a traçar seu caminho e tomar as próprias decisões, fossem elas inteligentes ou não e, para sua infelicidade, o mero pensamento sobre essa situação fazia suas pernas tremerem e um temor irracional correr por seu peito. Por outro lado, estava muito longe para voltar atrás e desistir, por assim dizer, afinal, estava sozinho e...

Oh!
Não, não. Como ele bem lembrou, ainda que um pouco tardiamente, não estava solitário.

Retirando uma pequena esfera bicolor do bolso, o rapaz apertou o objeto, observando-o crescer em sua mão e partir uma fresta no centro, de onde escapou um feixe luminoso que zuniu do interior e se chocou contra o chão. Enquanto a luz moldava o formato de um corpo pequeno e magricela, um ótimo questionamento rondava a mente - seria ele um treinador ruim por já esquecer o próprio pokémon, ou seria uma atitude perdoável se fosse considerar que a) não estava acostumado com a ideia e b) ainda estava nervoso com tudo que o envolvia?

...Não importava.
Gramíneos não liam pensamentos, ora pokébolas.

E foi justo um que tomou seu lugar no espaço quando a luminosidade finalmente se dissipou. Um bípede com uma expressão sonolenta, que bocejou assim que foi liberto da cápsula que o aprisionava, e a primeira reação foi apertar bem os olhos e se espreguiçar, emitindo um grunhido preguiçoso. O monstrinho piscou algumas vezes e esfregou o rosto antes de finalmente se dar conta do homem ajoelhado à sua frente, fato que o fez arregalar os olhos e dar um pequeno salto. Com a apresentação que veio a seguir, porém, o inicial estreitou brevemente o olhar e colocou uma das mãos no queixo, como se analisasse o treinador... E então, apoiou uma pata na barriga e se curvou numa mesura, dando um aceno alegre à Henry quando se endireitou, além de um sorriso aberto. Bem, ele não parecia ter problemas de se enturmar, ao que tudo indicava!

Flores não se deu o trabalho de observar a área onde tinha parado, mas Chespin parecia interessado em fazê-lo, olhando de um lado para o outro, curioso. Apesar de ainda ser próximo ao meio dia, não existia tanto movimento naquela rua além de umas pessoas passeando aqui e ali, algumas lojas, lanchonetes, restaurantes e até mesmo residências - numa vista superficial, nada que chamasse a atenção do pokémon, que deu de ombros e voltou a atenção ao novo parceiro. Parecia querer conhecê-lo melhor!

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Enquanto o pequeno parecia se acostumar com o mundo do lado de fora, Henry tomava seu tempo para se levantar (e não arranjar um problema no joelho, talvez), retirar o leitor eletrônico avermelhado para mirar em seu mais novo inicial e ouvir atentamente as informações oferecidas pelo aparelho.

Pokédex escreveu:Chespin, pokémon número 650.
Possui espinhos maleáveis em sua cabeça que podem se enrijecer e afiar, se tornando capazes de perfurar rochas.
Uma espessa casca de madeira cobre suas costas e cabeça. Até mesmo uma batida de caminhão não a quebraria.

Com a nova oferta de Flores, porém, o gramíneo parecia se animar. Viu espaço em seus braços, e não se conteve em saltar imediatamente para eles - o treinador logo descobriu que, apesar da aparência pequena e esguia, o pokémon era bem mais pesado do que parecia. Nada impossível de carregar, mas certamente com alguma dificuldade inicial, pelo menos. O espécime emitiu um som animado, balançando os bracinhos, com o sorriso usual estampado no rosto.

Algumas pessoas, como bem dito, ainda andavam na rua.
O rapaz poderia tentar pedir informação - até mesmo de um dos comércios - ou simplesmente... Vagar por aí e tentar a sorte.
Qual seria sua decisão?

Como bem mencionado, ainda que não fosse um completo "caipira", por assim dizer, Henry ainda não havia tido boas chances de conhecer a cidade - inclusive, tinha tido até sorte de ter encontrado a pessoa que lhe dera um inicial, considerando essa situação -. Sua opção mais segura, ao invés de ficar zanzando sem rumo por aí, era pedir informação: E foi exatamente isso que o monotreinador optou por fazer, após traçar caminho por algumas curvas da cidade. Analisando as pessoas que passavam, refletiu qual seria aquela que, pelo menos aparentemente, seria a melhor para abordar. Uma das que mais lhe chamou a atenção foi um senhor grisalho sentado num banco, que observava o movimento - o homem usava uma blusa xadrez azul de manga longa, e apoiava as mãos em uma bengala prateada.

A atenção do homem, claro, foi voltada à Flores quando ele se apresentou. O cumprimentou, então, com um breve sorriso e um acenar de cabeça.

— Bom dia, rapaz. — Respondeu, e os olhos castanhos se voltaram pacientemente à rua. Pareceu divagar por um momento, e muito menos parecia com pressa. — Faz um tempo que não escuto isso. Normalmente todos os que passam com pokémons estão sempre apressados demais pra lá e pra cá, e com destino em mente. — Comentou, esboçando um sorriso vago. — Você deve ser um treinador novo, então? — Perguntou, sem sequer olhar para o moreno. O único problema era que, no fim, não havia respondido a pergunta direcionada a si, em contrapartida...

Como o rapaz procederia?

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Por vontade ou meramente educação, Flores se viu praticamente induzido à parar para a pequena conversa que o senhor puxava. Quando se inclinou para sentar no banco, o homem pacientemente se afastou alguns centímetros para o lado, permitindo que o rapaz aproveitasse um espaço maior do assento. Apesar de correr o risco de perder algum tempo, era bem capaz que pudesse tirar proveito daquele diálogo inesperado para assentar algumas ideias e, possivelmente, evitar de fazer alguma besteira a qual se arrependeria depois.

— Ah, isso é bom, bom... — Retrucou, com um sorriso paciente no rosto. — Sabe, já faz um tempo que eu não vejo um novato. Ou, bem, a maioria dos que eu vejo são crianças, também... — Comentou, com o olhar se desviando brevemente ao monotreinador, antes de se permitir um sorriso simpático. — Você acha muito difícil? Eu sempre quis seguir essa linha de aventura, mas eu nunca tive coragem de sair por aí sem rumo, na verdade. — Divagou, voltando os olhos na direção do céu e suspirando brevemente. — Eu me arrependo um pouco por não ter arriscado, também. Mas, ora, isso é só papo de velho. Não precisa me dar atenção. — Concluiu, com uma risada amistosa. — Esse aí é o seu primeiro? — Questionou, apontando com o polegar para o gramíneo que repousava no colo de Henry.

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— Oh! Isso é bom, com certeza. Ele já tem um nome? — Questionou, observando em silêncio a breve interação carinhosa entre treinador e pokémon, se permitindo dar um pequeno sorriso simpático. Não muito tempo depois, entretanto, o jovem Flores pareceu desanimar da ideia inicial de ficar perambulando a cidade - talvez por se dar conta que provavelmente encontraria mais pessoas que pokémons, ou simplesmente pelo desejo do contato com uma natureza mais... Aberta. — Eu imagino que você deva estar ansioso pra sair por aí, não? Eu compreendo. — Comentou, e olhou para o céu por alguns instantes, apertando as pálpebras. — Vejamos... — Murmurou, e olhou em volta, incerto. — Se eu não me engano, tem a rota 124, que é pra lá... — Disse, apontando para o oeste. — ...A 121, pra lá... — Emendou, indicando o norte. — E tem o mar, que é pro outro lado. — Finalizou, com um sorriso amigável. — Mas! Se você não estiver com tanta pressa... — Chamou a atenção do rapaz, batendo de leve a bengala no chão. — Sabe, eu tenho uma filha. Há algum tempo ela me deu um presente... — Falou, se remexendo no banco para retirar uma pequena esfera bicolor do bolso. — E eu ainda não tive tempo de aproveitar do jeito mais... Empolgante, se você me entende. — Comentou. O objeto se partiu em dois, e um feixe de luz moldou um pokémon mediano, bípede... E de duas cabeças?


— Você também precisa treinar, não precisa? — Perguntou, e estendeu uma das mãos para afagar uma cabeça da ave, e a outra, logo após. — Se quiser, eu adoraria ter uma batalha. Ele é novo, ainda, e embora eu seja velho, acho que estamos no mesmo nível! — Sorriu, divertido. — Caso deseje, pode começar. Mas não se sinta pressionado, porque qualquer coisa ele fica aqui me fazendo companhia. — Concluiu, se recostando pacientemente no banco. Restava que Henry decidisse, então.